25 de fevereiro de 2007

Ricardo Gondim

Em respeito aos tristes - 14/2/07

Confesso que sou introspectivo e, muitas vezes, melancólico. Quando era criança gostava de ficar debaixo de uma árvore, sozinho, para pensar na vida. Continuo assim. Prefiro o silêncio às festas, as refeições com poucas pessoas aos banquetes. E se não tomar cuidado, facilmente caio em depressão.
Essa minha índole quieta não me importuna, mas eu percebo que ela causa constrangimentos na comunidade evangélica. Nas poucas vezes que escrevi textos cinzentos, fui docemente aconselhado a não repetir tal deslize. Sinto-me censurado quando exponho meus sentimentos contaminados de uma vaga e doce tristeza. Sentimentos que, a bem da verdade, me comprazem e me conduzem à meditação. Mas como explicar isso? Fico sem saída, pois não quero só escrever textos sobre como me sinto campeão; recuso teatralizar minha solidez e não quero enganar sobre minha santidade.
Em diversas ocasiões tenho a sensação de estar só entre gigantes da fé. Haveria mais gente como eu? Sei que existem profetas, poetas e santos que também convivem com o desalento. Celebro a amizade, mesmo distante, dos que honesta e corajosamente, detectam sentimentos menos brilhosos e, iguais a mim, não se sentem culpados.
Ditosos os que choram, pois reconhecem que a vida não é composta só de luzes. Quem busca apenas o riso, querendo perenizar o prazer, cairá no profundo abismo do desencanto. Só os tristes sabem os segredos das noites sem lua e que, algumas dimensões nobilíssimas da nossa humanidade, somente se expressam em corredores de morte. Grandes são todos os que permanecem em pé mesmo quando não há luz nenhuma.
Ditosos os que entram em contato com suas angústias. Os que ocultam suas inquietações com frases e clichês religiosos, se condenam à superficialidade. Não existe tese religiosa que consiga se impor com mais força que a própria vida. De nada vale repetir slogans que prometem um mundo cor-de-rosa. Mais cedo ou mais tarde virá a tempestade que assola a casa. Ventos contrários varrerão projetos cautelosos e quem não edificar sua vida na verdade, ruirá implacavelmente.
Ditosos os que não se consideram emocionalmente incólumes. Eles sabem que ninguém possui controle direto sobre suas emoções e reconhecem, inclusive, que serão traídos pelos incidentes do cotidiano. Eles vão até o fundo do poço e não se sentem fracassados, pois sabem que tanto alegrias como tristezas são passageiras.
Ditosos os que admitem suas depressões. Eles não tentam sublimar as inquietações com ativismos. Sofrimento é a única dimensão da vida comum a todos os homens e mulheres. Quem tenta blindar-se das tristezas, precisa também se proteger da alegria. Fugir do sofrimento significa amortecer a felicidade.
Ditosos os que podem lamentar em público. Eles não precisam de sorrisos plásticos, de discursos demagógicos ou da arrogância religiosa, pois se sentem acolhidos em sua honestidade. Eles sabem que não serão apedrejados quando se mostram frágeis, porque vivem entre amigos verdadeiros.
Ditosos os que se parecem com Jesus de Nazaré. Ele nunca mentiu sobre sua angústia ou solidão. No jardim afirmou: “Minha alma está triste até a morte”. Na cruz bradou: “Pai, porque me desamparaste?”. Mesmo depois desses desabafos Deus lhe deu um nome que está acima de todo nome. Se o Filho Unigênito pôde falar assim, ninguém deve temer revelar o tamanho de sua vulnerabilidade.
Esses ditosos podem seguir tranqüilos pela vida, porque a tristeza segundo Deus não é para a morte. Aleluia.


Soli Deo Gloria!

Nenhum comentário:

Postar um comentário